terça-feira, novembro 20, 2007

Poetas escritos, poemas encarnados...

Os poemas são poetas escritos.
Toda a lírica não mais é do que a découpage de uma alma numa página antes opaca,
Plena logo de tonalidades translúcidas,
Complacentes miragens residuais do frívolo artífice que lhes deu aparência,
Moldando-as a tinta como um escultor talha a pedra com o cinzel,
Ou simplesmente como um qualquer deus distraído,
Que tropeça na sua própria ausência deixando cair dos braços um big-bang de múltiplos quase-nadas,
Vibrações e impressão de familiaridade que nos habitam à socapa,
Na mordaz tentativa de nos converter em algo mais do que meramente humano,
Empresa demasiado auspiciosa para ser conduzida sem despiste.

Os poetas são poemas encarnados.
Todo o louco não mais é do que a soma de toda a lucidez,
Demasiado avultada para se contentar com um lugar na plateia,
Já que, afinal, verdadeiro lugar de espectador apenas ao intemporal tempo cabe,
Esse desonroso almocreve, senhor de infinitas searas,
Que aluga ceifeiras nas breves temporadas de colheita,
Mandando-as depois de volta ao nada que sempre foram,
Ilusão de profundidade e elegia do divino.

No fundo,
Todo o poeta se escreve,
Todo o poema o encarna.

19/11/2007
5:14

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