quinta-feira, outubro 29, 2009

Rasga-mentes.

Trepidação,
Constipação,
E tédio vil,
Filas às mil,
Nesta prisão,
Neste covil.

Compreensão,
Habituação,
Vício atroz,
Garra feroz,
No coração
Falha-me a voz.

Interjeição,
Apreensão,
Gritos de dor,
Risos sem cor,
Na minha mão
Jaz meu amor.

Preparação,
Consternação,
Medo de dar,
Medo no olhar,
Medo de um não,
De um não amar.

A colecção,
Fados de então,
Jeito de ser
Mais um prazer,
Perco a razão,
Volto a nascer.

Um paredão
Em construção,
Uma janela,
Espreito por ela,
Morre o perdão,
Fecho a cancela.

29/10/2009
21:33

sexta-feira, outubro 16, 2009

Recado.

Nos mistérios do divino
Rondam vazios inconcretos,
Silêncios que em desatino
Vão passando a pente fino
Os rebeldes insurrectos;

Esses que buscam sem rumo
Esclarecimento profundo,
Que sem fogo não há fumo,
E sem saber não há prumo
Que seja Atlas do mundo.

Com tanto já desvendado,
Tanto mais por conhecer,
Deixo ao Eterno um recado:
Quem se lembrou do pecado
Bem poderia entender

Que não há espírito pleno
Sem o condão da verdade;
Por reles, tosco e pequeno,
Não há homem mais sereno
Do que aquele sem idade.

16/10/2009
1:27

segunda-feira, outubro 12, 2009

Quintilhas.

A liturgia elevada
Exponenciação da loucura
Uma utopia encarnada
Na voz do fado entoada
Fuzileira da censura

Almas vivas, desgarradas
Na complacência das musas
Nas noites mal afamadas
Um pescoço, sete espadas
E um céu de estrelas difusas

Ondulação delirante
Em espuma e ventos e lodos
Oração do nosso Infante
Jóias e sangue a montante
E a jusante os medos todos

Glórias e escuras derrotas
Inocência desculpada
Nestes jogos de batotas
Lançam-se os dados às rotas
À primeira badalada

À margem, silenciosos
Nas labaredas urdindo
Os homens audaciosos
Que se fazem poderosos
Nos cais desse mundo infindo

Na Bíblia do nosso fado
Rezam profetas ateus
Não há chão que seja errado
Porém, não esqueças cuidado
Que é certeira a mão de Deus

12/10/2009
18:50

segunda-feira, outubro 05, 2009

Apontamento.

Nunca antes conhecera saudade como esta,
Agridoce,
Que inebria o espírito e consome a mente...
É uma saudade simbiótica,
Que me encurrala em sonhos e me veste lutos insalubres,
Que arranha ao engolir
E que me perfuma a garganta com o paladar metálico do seu gume.

Saudade, que não aporta nem se abriga,
Que se entrega aos temporais desabridos da minha rejeição
E que naufraga nos meus silêncios toroidais de ciclos estéreis de mera estática.
Todos os dias me rouba um pouco,
Sem que em nada me acalente com meigos laivos consoladores;
Uma eterna dança de marés que depovoam praias
E amontoam escolhos nas profundezas
De mim...

Quem dera que um dia se gastasse essa impecável pontaria,
Ou que porventura à contemplação se rendesse,
Ou mesmo que se entregasse ao rumor crepitante do Eterno para que,
Enfim,
Repousasse.
Assim, com o paladar apurado e a textura amaciada,
Pudesse eu saboreá-la e dela nutrir o meu desalento;
Fosse eu capaz de ensiná-la a não pecar,
E seria eu o arlequim da frescura de todos os dias.

Nunca antes a saudade fora saudade...

29/09/2009
17:38