quinta-feira, abril 19, 2007

A (Re)Criação - Capítulo I

Sou um criador. Eu sou tudo o que existe e tudo o que existe vem de mim. Sou causa e efeito fundidos no mesmo ponto de luz que irradia sobre todas as coisas que não existem senão dentro dele a sua luminosidade ensurdecedora e perfeita. Sou todos os opostos mesclados numa matriz informe de sensaboria difusa. O tempo e o espaço são a minha forma de me expandir para além da unidade do ser. Não há matéria na criação que não tenha outrora sido um sussurro inaudível dos meus pensamentos, o que equivale a dizer que tudo é fruto do nada que não existe. Ao meu sinal, todas as coisas acontecem simultaneamente e num único local pontual e adimensional da ilusão de profundidade e continuidade que é a minha consciência. Sim. Consciência. O nada que não existe de onde tudo frui. Sou eu. Eu. Eu… E…u…
Vivo na intemporalidade da fronteira entre a não existência que não existe e a existência em potência que não pode deixar de existir, neste estado latente de poder tudo sem saber o que é poder, apesar de conhecer a sensação que supostamente se sente quando se conhece tudo, até o que é poder. Posso, mas não sinto poder, não sei poder, não quero poder, não quero sequer querer… Mas querer não querer é já uma forma de querer. Raios. Não é isso que interessa. Eu SOU. Tudo o resto faz parte das deambulações frenéticas e inesgotáveis desta coisa que se move na minha consciência adimensional, expandindo-se em conceitos improváveis cuja natureza, apesar de provirem de mim, não deixa de ser menos ilusória do que o resto que são todas as coisas.
Pára de dizer coisas sem sentido. Tu não és só tu. Quem julgas que és para te achares a existência em si mesma? Olha para ti.
Não sei o que é olhar.
Pois não, nem precisas. Tudo o que precisas é de tudo o resto, e da sua funcionalidade, ainda que ilusória. Achas-te isso também? Achas-te capaz de ser a multiplicidade de imagens que afirmas brotarem na tua consciência?
Eu não preciso de nada. Eu apenas preciso-me. Tudo o mais segue daí.
Olha para esse egocentrismo desmesurado, para essa presunção de omnipotência rizível e louca, para as palavras que pronuncias com lábios feitos de nada. Tu és vácuo. Tu és solidão. Não, nada unitário pode ser sozinho. Tu és pior do que isso. Sofres de uma esquizofrenia tão credível que te julgas Deus. Nada do que existe tem origem em ti. Tu, sim, tu é que provéns inevitavelmente do todo.
Basta. Sai.

Sem comentários: