segunda-feira, maio 28, 2007

O Velho (tributo à minha infância)

O velho era alto e encorcovado,
Direito como um garrouxo,
Era cego e mudo e coxo,
Era careca e pelado,
Era ruço e encinzado.
Para ver se ainda casava,
Não comia nem jejuava.
Foi beber ao chafariz,
Chegava-lhe a barba ao nariz,
E não podia roer a água.
O velho tinha uma samarra
Com fivelas de lata,
E em pondo or’ele uma gravata,
Parecia-me o velho um barra.
Cantava como a cigarra,
E era mestre e pai de cantigas,
E podia ver-se comer migas
Pelas grossas cor de veias,
E tinha calos nas gengivas
De partir pinhões às mãos cheias.



(Abrindo uma excepção que talvez se venha a repetir no futuro, partilho hoje uma lengalenga muito antiga que a minha avó costumava contar-me vezes sem conta, e que já ela aprendera com o seu pai. Não é da minha autoria, como já mencionei, mas achei importante partilhá-lo porque, juntamente com todas as outras histórias e lengalengas e quadras que a minha avó me contava, foi co-autor daquilo que sou hoje. Por tudo isso, estou muito grato.)

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